quinta-feira, 21 de maio de 2009

Desvio de caráter em Santa Catarina

O caráter solidário do povo brasileiro já foi exaustivamente testado em inúmeras campanhas desencadeadas, com imediata adesão de todos os segmentos da sociedade mobilizados e atentos às carências da sociedade. Em vários níveis, a participação voluntária é perceptível, muitas vezes com instituições e grupos agindo em paralelo à responsabilidade do Estado, oferecendo verdadeiras lições de altruísmo e doação.
Ao par deste infatigável exército benemerente sempre têm os espertos, os demais que sempre procuram tirar vantagem de tudo, aqueles para quem as palavras corrupção, honestidade, vergonha na cara, ética ou espírito público não tem qualquer sentido prático. São aqueles que se locupletam da desgraça alheia, que crescem com a miséria e não são capazes de demonstrar qualquer gesto de solidariedade, compaixão ou respeito. Os que aparecem muito comumente no noticiário policial, econômico ou político denotando a existência de um câncer social facilmente identificável e de difícil extirpação.
Quando as tempestades castigaram o Sul do País em novembro do ano passado, deixando um triste rastro de destruição e mortes em Santa Catarina, os espíritos solidários se levantaram em consternação e trataram de promover campanhas de Norte a Sul para arrecadar roupas, mantimentos e tudo que fosse necessário para ajudar os desabrigados a recompor suas vidas com dignidade. Foi um ato marcante do caráter brasileiro, que não fecha os braços diante das dificuldades e esquece diferenças na hora de ajudar o próximo. A resposta foram toneladas de doações levadas ao Estado sulista, em atendimento ao apelo dirigido às pessoas de boa vontade.
Ao vir a público a denúncia de que 350 mil peças de roupas, calçados, alimentos e colchões doados às vítimas das enchentes estavam armazenadas e sendo vendidas por um empresário, a comoção pública se transformou em profunda repulsa. Ismael Ratzkob desviou o material com a conivência de alguém da prefeitura de Ilhota e abriu três pontos de venda como brechós. Alegando não ter feito nada errado, o empresário disse apenas que o material seria “sobra das enchentes”. Não bastasse o fato de haver ainda milhares de desabrigados no Nordeste do País, que poderiam ser beneficiados com o reencaminhando das doações. Pelo menos, foi preso sob acusação de receptação e formação de quadrilha.
Fatos como esse alimentam a sensação de que o povo brasileiro acaba tendo que conviver com uma classe de pessoas desprovidas de moral, sem qualquer pudor de fazer seus trambiques, de aproveitar-se dos vácuos legais da sociedade para tirar proveito de tudo. Nestes casos, é preciso agir com rigor, impor uma punição exemplar para impedir que gestos como esses sejam cercados de impunidade, gerando uma tropa desqualificada que acaba por eleger seus iguais na política.


(Correio Popular, 21/5)

2 comentários:

Fernando Parizi disse...

O título do editorial é um tanto preconceituoso, pois a prática dessa falcatrua parece se limitar ao tal "empresário" e algum comparsa dentro da prefeitura de uma cidade. Não se justifica associar o delito ao nome do Estado de Santa Catarina. Como não teria sentido titular "Desvio de caráter no Piauí" porque um motorista canalha, com a cumplicidade de funcionário(s) público(s) desviou para vender na surdina cestas básicas que eram destinadas a flagelados de enchente em Taresina. Ou Campinas merece carregar o estigma do "quercismo"?

Rui Motta disse...

Não há preconceito. Os fatos ocorreram mesmo EM Santa Catarina.Não falei de falta de caráter DE Santa Catarina ou de catarinenses.