quinta-feira, 7 de janeiro de 2010

Uma reforma trava-línguas


A língua é um dos maiores patrimônios de uma nação, que assim formaliza sua identidade cultural, formal e histórica. É através da linguagem que se perpetuam os valores, os legados de cada geração, a produção intelectual, as formas de comunicação que se alteram ao longo dos anos. A língua é viva, dinâmica e moldada ao sabor das transformações sociais e das peculiaridades de cada tempo.

O português é hoje falado por mais de 210 milhões de pessoas em todo o mundo, sendo a segunda língua românica do mundo, a terceira europeia, a mais falada no planeta, a sexta com maior número de locutores e a quinta com maior número de países que a têm como língua oficial. Essa extrema difusão da língua é decorrente do processo de colonização dos portugueses que, através dos descobrimentos e de suas colônias, espalharam sua cultura nos cinco continentes. Em termos modernos, a revolução das comunicações via internet atesta a importância do universo da língua portuguesa: o português é a quarta língua mais usada na Internet e a segunda na "blogosfera".

Esse grau de importância nem sempre é reconhecido pelos próprios brasileiros, que têm enraizada a falta de conhecimento do próprio idioma e são reféns de um sistema educacional que não oferece as ferramentas ideais para que toda a riqueza de expressão seja utilizada em sua profundidade e beleza. Nos bancos das escolas, o ensino da língua é penoso e a falta de leitura e hábito de escrever corretamente agravam as dificuldades que vão sendo expostas ao longo da vida pessoal e profissional.

Quando um grupo de linguistas, filólogos e intelectuais se propõe a fazer uma reforma ortográfica, começam a ser enumeradas as justificativas e as oposições às mudanças, que deveriam servir para estreitar laços culturais, construir facilidades de comunicação e refletir a realidade da língua adotada em oito países. Proposto em 1990, o acordo de unificação ortográfica não agradou a nenhuma parte. De início, os portugueses ressentiram-se da excessiva predominância da língua falada no Brasil, o que levou a impasses que postergaram a adoção do acordo, que agora completa o primeiro ano de implantação oficial em nosso país.

Criticado por especialistas, o acordo baixou no cotidiano dos brasileiros como uma regra imposta, plena de absurdos conceituais que não resistem à mínima argumentação, criando entraves aos mais ciosos com a correção gramatical. Mesmo acima das questões puramente técnicas, a reforma introduziu dúvidas em questões de interpretação, discordância em aspectos sérios de comunicação, longe de ser um instrumento respeitado e considerado oportuno.

As dificuldades iniciais certamente serão superadas, os impasses superados e a maioria das pessoas continuará escrevendo sem muito rigor ortográfico. E a reforma, como toda lei que vem imposta de cima para baixo, com toda a carga do preciosismo técnico, se mostrará inconvenientemente falha.

Nenhum comentário: