sexta-feira, 8 de janeiro de 2010

A farra das passagens, de novo

O ano que passou ficou marcado na história brasileira como um período típico, recheado de escândalos quando não se poderia imaginar mais possibilidades de ver políticos chafurdando na lama da corrupção e do descaso com o interesse público. A capacidade dos homens públicos reinventarem os meios de desviar verbas e tirarem proveito dos cargos é inesgotável e a cada dia se descobrem maior envolvimento dos políticos em casos que vêm à tona na medida dos interesses dos denunciantes.

Quando se esperava que a avalanche do mensalão petista pudesse levantar a indignação popular e refrear a sanha dos predadores do erário, percebe-se que a corrupção é mal entranhado, profundamente arraigado na vida pública, difícil de ser extirpado a não ser por um longo processo de depuração democrática e pelo acionamento das forças institucionais para barrar os abusos que hoje são perpetrados impunemente, para desespero dos legalistas. Por todos os lados e em todos os matizes partidários podem ser apurados casos de desvio de conduta, corrupção, uso irregular de verbas públicas, impune e arrogantemente perpetrados pelos políticos.

O episódio das denúncias contra o presidente do Senado federal José Sarney escancarou um mundo de sujeira e falta de ética que transformou os corredores de Brasília em pocilgas. Os benefícios auferidos pelo ex-presidente, familiares e apaniguados excedem o razoável, mostram o quanto os parlamentares e governantes brasileiros são ávidos por se autoconcederem vantagens de todo tipo, como se vivessem em universo paralelo onde estão acima das questões de consciência, dos limites da ética e da seriedade.

Entre os escândalos protagonizados no Congresso Nacional, a farra das passagens aéreas mostrou de maneira clara e evidente o quanto os desvios de verba acabam sendo incorporados na rotina brasiliense, sem que muitos parlamentares sequer se dêem conta da gravidade de seus atos. O uso do benefício de representação está totalmente desvirtuado, servindo para favores pessoais, eleitoreiros e como cortesia com o chapéu alheio. Depois da exposição negativa na mídia, a Mesa Diretora do Senado baixou norma restringindo o uso das passagens de um exercício para outro, dando um caráter de transparência ao direito que os senadores tinham de cinco viagens por mês.

Baixada a poeira do escândalo, na meia-luz do encerramento do ano, o presidente Sarney assinou nova medida que ressuscita a prática de usar a milhagem aérea por tempo indeterminado. A intenção se justifica em ano eleitoral, quando 54 das 81 cadeiras do Senado serão renovadas e os interessados em reeleição terão esse recurso extraordinário para fazer campanhas em seus estados de origem. A alegação no texto do ato administrativo de que os senadores ainda não se acostumaram com as novas regras é pueril. Vergonhoso é os senadores estarem acostumados com o que não é ético, moral e legal.

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