domingo, 6 de dezembro de 2009

Meias verdades em Brasília

Ninguém é inocente a ponto de supor que o problema da corrupção na política brasileira teve início apenas nos últimos anos e se encerrou após o desvendamento do emblemático escândalo do mensalão, que ficou marcado como um episódio que despertou a consciência dos cidadãos brasileiros, raramente afeitos ao debate das questões institucionais. A manipulação de verbas é uma praga profundamente arraigada na vida pública, envergonhando a nação, estarrecida diante de tanta corrupção disseminada.
A interminável sucessão de escândalos na esfera política deixa marcas indeléveis no caráter dos brasileiros. Não é possível tanta safadeza e desonestidade sem que nada resulte em punição exemplar, que os governantes e parlamentares possam permanecer em seus cargos com tamanha desfaçatez, zombando da justiça, do espírito de cidadania de seus representados, fazendo da vida pública um ambiente nauseante e impróprio. A corrupção mina a tolerância dos cidadãos, afeta o caráter das gerações, sedimenta o sentimento de impotência contra os espertos e da inutilidade da honestidade.
É surpreendente a capacidade dos políticos se renovarem. Quando se pensa ter chegado ao fundo do poço, descobre-se novo escândalo e que ainda há muito o que descer. As tramas são infindáveis e as revelações se sucedem acrescentando novos personagens a antigas maracutaias e costumes. Como na mais recente denúncia que tem por palco Brasília, o espelho exemplar da vida política brasileira em todos os níveis. Ali, cristaliza-se o sistema pérfido de assacar contra o erário de todas as formas, beneficiando aqueles que já acumulam benesses imerecidas.
O envolvimento do governador do Distrito Federal José Roberto Arruda em esquema de pagamento de propinas de empreiteiras joga mais lama sobre a política local. Não apenas o gabinete do governador, mas assessores, membros do secretariado, deputados distritais estão envolvidos em recebimento de dinheiro de forma escandalosamente venal, servido aos maços, escondidos em bolsas, meias e cuecas. O alcance da corrupção coloca em xeque todo o processo sucessório em caso da renúncia ou impeachment de Arruda, por envolver seus sucessores em cascata.
O que mais escandaliza é a reação hipócrita dos acusados. As câmeras revelaram risos marotos, absoluta falta de vergonha, gestos descontraídos, como se tudo não passasse de um ato normal, um encontro de compadres, uma troca de presentes, um pagamento devido. A corrupção é uma chaga imensa corrói a epiderme institucional brasileira, alastrando-se de forma preocupante. Os políticos perderam a noção do que seja moral, já não sabem o que é normal fora do falso universo em que se confinam em valores aéticos. As desculpas esfarrapadas - culminadas pelas declarações contemporizadoras de praxe de Lula - revelam apenas a inaceitável realidade de que a corrupção, queiram ou não, é parte vital do organismo político desmembrado a partir de Brasília.

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