terça-feira, 10 de novembro de 2009

Razão de saia curta


A questão da moral no seio da sociedade é um assunto de extrema delicadeza e de conveniente profundidade, de forma que o preconceito e a intolerância não se sobreponham aos direitos fundamentais de cada cidadão. Os limites de comportamento impostos às pessoas apenas refletem os padrões que são aceitos pela maioria, resultando no grau de aceitação de cada um em seu grupo de identificação ou de afinidades culturais.


A homogeneidade de comportamentos é inaceitável. As pessoas têm caráter e personalidade diferenciados, moldados a partir de inúmeros fatores psicológicos, físicos, culturais, éticos ou mesmo estéticos, com total liberdade de escolha pelo que lhes convêm, desde que respeitados os limites da transgressão de valores da mesma sociedade.O caso de flagrante intolerância envolvendo uma estudante da Universidade Bandeirante (Uniban), de São Bernardo do Campo, teve uma repercussão extraordinária pelo caráter inusitado dos fatos e seus desdobramentos, expondo um momento de intolerância e violência tolerados, onde vários princípios foram violados em nome de uma reação desmedida pela quebra de um pretenso padrão de moral da instituição.


Fica evidenciado que a universidade tem o direito natural de estabelecer os seus próprios padrões e rituais sociais, determinando os quesitos de disciplina, vestimentas, atitudes dentro da escola, em pacto aceito pelas partes. Mas têm também os educadores o compromisso e responsabilidade de manter o nível de relacionamento em suas instalações, não permitindo ou estimulando atitudes de agressão como as registradas no caso. Ao retroceder na intenção de expulsar a aluna envolvida no episódio, o reitor da Uniban cede posições ou busca uma saída menos comprometedora do que as evidenciadas nas primeiras manifestações, quando precipitou-se em julgamento moral que não lhe cabia.


Se a jovem teve algum comportamento indevido, nada justifica a escandalosa repressão a que foi submetida. A óbvia desproporção entre o fato de usar uma saia curta e a humilhação que lhe foi imposta mostra o quanto o espírito de descomprometimento com limites sociais está arraigado no espírito daqueles jovens, levados a uma espécie de catarse coletiva irresponsável, de fundo e motivações dificilmente explicáveis. Os jovens envolvidos demonstraram um laivo de desrespeito e infundada intolerância, não compatível com os hábitos e costumes dos mesmos estudantes, certamente expostos a situações onde as roupas e os atos não são menos ousados e nem por isso suscitam reações de violência.


O episódio apenas adquiriu tal proporção por conta da ampla exposição inicial na internet. Serve como um paradigma de reflexão sobre o comportamento da nova geração, conflituosamente dividida entre a liberdade e as indefinições de padrões. Uma geração que é bombardeada por imagens, conceitos, informações e cultura não pode deixar de lado o absoluto respeito ao direito dos demais e à natural diversidade de padrões morais e estéticos. Menos que isso é mera hipocrisia.

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