terça-feira, 20 de outubro de 2009

Crime e o vácuo do Estado


O Estado é o responsável pela administração e solução dos conflitos sociais, tendo, por definição constitucional, o encargo de prover à sociedade a sua segurança, tida como direito primário e essencial, que não pode nem deve ser subtraído por inépcia dos governantes ou por retração de investimentos. A estabilidade do sistema depende do quanto os cidadãos podem se sentir seguros e sob a proteção da lei e das autoridades de segurança.

As causas da violência podem ser explicadas por diversos fatores que compõem o ciclo de formação dos bandidos, como as estruturas sociais abaladas, a falta de suprimentos essenciais em educação e civilidade, além das fortes conotações psicológicas que levam a graves quadros de delinquência. Mas contribui muito com o alastramento da criminalidade a omissão do Estado, que se deixa subjugar pelas forças marginais, geralmente alinhadas ao tráfico de drogas que subsidia um amplo espectro de quadrilhas que agem dentro e fora das grades.

Os episódios que marcaram o final de semana no Rio de Janeiro são a expressão clara do quanto a ausência do Estado favorece a existência de facções criminosas que agem abertamente, impondo sua autoridade paralela sobre parcela significativa da população, estabelecendo um padrão distinto de legalidade em território onde o domínio dos bandidos é evidente. Os morros cariocas são o exemplo acabado de como os marginais conseguem criar barreiras físicas e morais para manter a polícia convenientemente a distância, exercendo seu poder sobre seu grupo e a comunidade.

Os conflitos recentes começaram com a disputa de pontos de tráfico, antagonizando grupos acionados a partir de comandos espalhados pelos morros São João e dos Macacos. A intervenção policial para conter as mortes foi combatida com a derrubada de um helicóptero da Polícia Militar, quando morreram três soldados, e a queima de ônibus do transporte coletivo. O serviço de inteligência da polícia do Rio de Janeiro revelou que as investigações apontam que a invasão das quadrilhas foi acionada por chefes da facção Comando Vermelho de dentro do presídio federal de segurança máxima de Catanduvas, no Estado do Paraná. Até ontem, ao menos 14 pessoas morreram nos conflitos entre traficantes e com a polícia.

Os fatos denunciam várias falhas no setor de segurança. A forma como o poder é disputado, em guerra aberta nos morros, aponta para a liberdade que os traficantes têm para medir forças. O uso de armamentos pesados é outra característica que assombra, mostrando que as conexões das quadrilhas são importantes e audaciosas. A voz de comando sair de dentro de um presídio considerado de segurança máxima é algo fora da compreensão de quem pretende um sistema eficaz de proteção aos cidadãos. Denota um descontrole profundo da situação, um esquema de corrupção que passa pelos governos que não impõem uma política de segurança e dos policiais que se abstêm de combater abertamente o crime. No meio do fogo cruzado, fica a sociedade refém da violência.

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