Ao Estado cabe zelar pelos direitos dos cidadãos, estabelecendo as regras de relacionamentos e os parâmetros de convivência harmoniosa, ao passo em que supre as atribuições constitucionais de atuar nos setores essenciais. A intervenção oficial deve se restringir às questões de ordem tributária, de investimentos, obras e serviços, administrando a dinâmica do governo de acordo com as metas difundidas a claro. Assuntos que dizem respeito ao direito e hábitos dos cidadãos são regrados pela legislação que estabelece os limites de liberdade individual.
O uso do tabaco em locais públicos já ocupa há tempos o debate na sociedade, dividida entre as tendências de limitação absoluta do consumo, a exemplo de alguns países europeus, ou medidas conciliadoras, estabelecendo locais adequados onde fumar seria liberado. O interesse de defender o direito de quem não deseja inalar fumaça é procedente e deve ser estimulado a partir de restrições ao uso do tabaco. Pesquisas recentes mostram os efeitos nocivos da inalação involuntária da fumaça de cigarros, justificando a defesa dos incomodados. Várias investidas levaram à criação de uma legislação federal que determinou a instalação de espaços específicos para fumantes em empresas e estabelecimentos comerciais.
A nova lei antifumo sancionada nesta semana pelo governador de São Paulo José Serra instalou uma polêmica na opinião pública, trazendo consequências significativas no dia a dia das pessoas e lançando desafios para a sua implementação. Ao aprofundar os efeitos da lei com rigor inusitado, em confronto direto com o estabelecido por lei federal, o governo assumiu claramente o partido dos não fumantes, deixando de lado considerações importantes que poderiam contribuir para se atingirem os objetivos de preservação de saúde sem antagonizar as partes envolvidas.
Ao proibir o consumo de cigarro em quaisquer áreas de uso coletivo, salvo as exceções de estádios de futebol, quartos de hotel e ruas, o governo estabeleceu um perigoso precedente ao condenar sumariamente os fumantes como criminosos, alvos de uma perseguição que assume ares ideológicos, radicais. Mais do que intervir diretamente em hábitos legais, o governo usou de expediente condenável, deixando a sociedade dividida em duas facções sujeitas a uma avalanche de denuncismo e conflito que deveriam ser evitados.
Ressalve-se a inconveniência da lei que se mostra clara quando o Estado se arvora no direito de legislar sobre a propriedade privada, ao proibir o uso de cigarro em estabelecimentos comerciais como bares e restaurantes. O racional da medida seria limitar o fumo em locais públicos onde a presença das pessoas é compulsória, deixando para os empresários a decisão e risco de permitir ou não o fumo em seu estabelecimento. Aos eventuais clientes, a escolha entre o que lhe convém e o que realmente incomoda.
(Correio Popular,11/5)
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