segunda-feira, 16 de fevereiro de 2009
Recursos e embaraços processuais
Quando a sociedade se estrutura em todos os níveis, estabelece os parâmetros que determinarão as formas de relacionamento, a administração de contendas e as maneiras de estabelecer sanções a quem apresentar conduta incompatível com os padrões instituídos. A aplicação da justiça se faz através de um código legal colocado na forma de leis e também pela moral entendida como o consenso do que é aceitável como forma de comportamento.
Na maior parte dos países, o sistema judiciário é organizado para aplicar a justiça seriamente, estabelecendo penas depois de preservados todos os direitos de defesa e argumentação. A rotina de investigação, formação de inquérito, acusação formal, julgamento e aplicação de punição se dá dentro de um processo detalhado pela Constituição, garantindo a todo cidadão o seu amplo direito de contestação.
No Brasil, o sistema se mostra distorcido diante da crônica falta de estrutura do Poder Judiciário, onde faltam juízes, pessoal administrativo e as condições de trabalho fazem com que os processos se arrastem indefinidamente, criando situações que, em alguns casos extremos, beiram o inacreditável, penalizando acusados, retardando a invocação do direito, postergando indenizações, deixando pendências que tendem a se agravar diante da omissão da Justiça.
Uma das situações mais graves diz respeito à prisão de acusados que aguardam a decisão final da Justiça. O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu recentemente que todo condenado tem, em princípio, o direito de permanecer em liberdade até que seja julgado o último recurso possível. A súmula do STF confirma o teor do Artigo 5º da Constituição Federal, que visa resguardar o direito de ninguém cumprir pena até que a decisão de culpa seja definitiva e irrecorrível.
A decisão foi saudada por especialistas em Direito, que colocam o direito individual acima de qualquer conveniência. É verdade que muitas distorções serão corrigidas, especialmente as promovidas pela própria lentidão da Justiça, que faz com que muitos processos se arrastem por anos sem que haja o desembaraço do julgamento final, contrariando interesses de todas as partes. Há mesmo casos relatados de presos que excederam o período da pena enquanto aguardavam o pronunciamento oficial.
Se, por um lado, a decisão reafirma princípio constitucional, deve-se relevar também que a situação cria embaraços evidentes, deixando criminosos livres enquanto houver recursos e advogados bem pagos para explorar todos os escaninhos da legislação para adiar sentenças. O importante é que a reafirmação do preceito constitucional seja acompanhada por uma revisão radical da estrutura do Judiciário brasileiro de forma a fazer frente à demanda de ações, dando respaldo a todas as instâncias necessárias para a preservação do direito, mas sem ceder à acomodação de admitir trânsito incompatível com a urgência que todo caso exige assim que chega às barras dos tribunais.
(Correio Popular, 16/2)
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