A moralização da vida pública passa obrigatoriamente por uma radical renovação dos costumes e dos personagens que se sucedem no poder, regurgitando velhas fórmulas de captação de votos e administrando as fontes de recursos sobre os quais lançam as mãos em gestos ávidos e descompromissados com a ética. Enquanto resistirem as velhas raposas da política, não sobrevierem forças renovadas, haverá poucas esperanças de mudança e novos tempos, onde a verdadeira representação popular se faça presente com maior legitimidade.
O caso dos diretores do Senado provocou forte reação popular, lançando mais revolta contra a classe política brasileira. Causou forte constrangimento a existência de 181 funcionários com salários que atingem R$ 24,5 mil mensais, ocupando-se de funções singelas como facilitação de embarque de parlamentares em aeroportos, acompanhamento de visita de turistas ou cuidar de comunicações de rádio. Causa revolta imaginar que um poder constituído tenha uma estrutura de atendimento que necessite tantos contratados para um quadro de apenas 81 senadores.
A gravidade da situação chegou ao ponto de sequer saberem informar o número exato dos obsequiados com os cargos, o que mostra o descalabro que ronda o Congresso Nacional, onde a noção de desperdício passa longe da realidade vivida por deputados e senadores, distantes da vida real quanto Brasília está de seus redutos eleitorais. O recém empossado presidente do Senado, José Sarney, posa agora de ilibado defensor da moral e da causa pública, reverberando alta indignação com o número de funcionários de alto escalão, encobrindo com desfaçatez que ele próprio foi o criador de 70% dos cargos que agora alega desconhecer.
Agora, anuncia-se a demissão de parte dos "diretores" em nome da moralização, ao tempo em que seria contratada assessoria da Fundação Getúlio Vargas para um estudo de reformulação administrativa no período de seis meses. É um gesto auspicioso, ainda que mínimo diante da gravidade do escândalo. A otimização do serviço público deveria ser objeto de constante atenção dos administradores, em nome do resgate da desgastada imagem dos políticos e pela eficiência transparente que se requer.
Esse episódio é apenas mais um que abala a sensibilidade do povo, cria um mal-estar crônico que alimenta uma cultura de descrédito, como se a estrutura moral da sociedade não tivesse qualquer relevância no mundo político. Questiona-se, até, se o princípio democrático que prevê uma representatividade legítima dos cidadãos é realmente respeitado no País, diante de tantos abusos e roubalheira, com cada qual querendo tirar proveito de indecentes vantagens e benefícios concedidos a si próprios. Se há espaço para uma reforma administrativa no Congresso, deve-se incluir um sistema que apure com mais eficácia o sentimento de revolta e repulsa que a sociedade nutre pela classe política.
(Correio Popular, 21/3)
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