A criação de um cadastro nacional de estudantes inadimplentes nas escolas particulares trouxe à discussão um aspecto sensível da organização social, expondo uma dura realidade que se apresenta como um impasse: segundo dados oficiais, cerca de 20% dos estudantes que se matriculam nas escolas particulares não têm condições de honrar os pagamentos contratados, criando uma legião de devedores que esgrima em acordos, renegociações e pedidos de descontos para conseguir se manter no rol de privilegiados que podem dispor de uma educação formal e acadêmica de mais qualidade.
O problema ganha dimensão por se tratar de uma questão crucial na vida das pessoas, que sempre têm a preocupação de buscar a melhor formação possível para viver uma sociedade altamente competitiva e que os melhores lugares são ocupados a partir de um alto padrão de exigência. O maior questionamento em relação à criação do cadastro de inadimplentes nas escolas recai somente sobre o caráter fundamental da educação, que desta forma estaria nivelada a qualquer outro produto de consumo.
Quando se considera o alto nível de inadimplência, que pode chegar a perto de 40% no caso do ensino superior, é necessário colocar no devido padrão os contratos de prestação de serviços entre as instituições de ensino e seus alunos. É possível inferir que boa parte dos devedores são vítimas da própria falta de planejamento e perspectiva, aventurando-se na tentativa de conseguir matricular um dependente e depois percebem a dura realidade de não ter recursos para honrar o contrato. Aí recai o ônus para a escola contratada, obrigada a administrar uma carteira de recebimentos em baixa.
Argumentar que as pessoas têm o direito de uma educação de nível não justifica o protesto contra o cadastro. Até porque seriam beneficiados justamente os maus pagadores, em flagrante injustiça a todos os demais alijados que são forçados a buscar nas escolas públicas o padrão ideal de ensino, conscientes da estreiteza de suas opções. Quando falha o sistema educacional brasileiro, com raras exceções que são disputadas, é natural que as pessoas se voltem para alternativas que sabidamente vão provocar sérias restrições ao orçamento familiar, algumas vezes até mesmo contando com a facilidade de renegociação ao longo da carreira estudantil.
O enfrentamento do problema se dá em outro nível. A responsabilidade de oferecer uma educação de alto nível é obrigação constitucional do Estado, que não deve repassar o impasse às instituições particulares, que também são regidas por normas e legislação pertinentes. Em vez de repassar para a iniciativa privada o ônus de oferecer cursos de qualidade, o governo deveria retomar os investimentos no setor, oferecer mais cursos gratuitos de nível universitário noturno e reforçar os programas de concessão de crédito educativo, como a Bolsa Aplub e o Programa de Financiamento Estudantil (Fies), que ainda estão longe de reavaliar a situação de penúria da Educação no Brasil.
(Editorial Correio Popular, 1/11)
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