Mais uma vez todo o Brasil se mostra chocado com o desfecho de outra tragédia humana, a morte da jovem Eloá depois de mais de 100 horas de suplício nas mãos de um ex-namorado desequilibrado, violento e, agora, matador. Todo o incidente mobilizou as atenções ao longo dos dias do cativeiro e a sociedade pôde acompanhar em detalhes todo o processo de negociação e as tentativas de dar fim ao que se tornou o mais duradouro seqüestro da história do Estado de São Paulo.
Passada a tensão maior provocada pela ansiedade de todos, cabe uma reflexão sobre todos os fatos, não apenas para se buscarem culpados pelo desfecho dramático, mas para apontar falhas e soluções possíveis para se evitarem erros como os que se sucederam no incidente. A própria ação policial deve ser vista com reservas, com sinais de evidentes falhas apontadas por especialistas, sendo a mais chocante o consenso de que a permissão da volta da jovem Nayara para o local do cativeiro foi absolutamente equivocada e contrária a qualquer recomendação técnica.
Também merece explicações as trapalhadas na hora da invasão, onde pareceria ser natural que houvesse um correto mapeamento do local, a presunção de que a porta estaria travada por dentro com móveis e até a escada capenga que tornou quase nula a invasão do policial pela janela do aposento ao lado. Os tropeços que resvalam no amadorismo colocam em xeque a competência e preparo da polícia especializada de São Paulo, que na precipitação da ação e na preocupação de atender demasiado à pressão da imprensa no local, cometeu deslizes que transformaram o drama em tragédia.
Não foram poucos os especialistas que condenaram vários detalhes da ação policial, de um primarismo comprometedor. Sabe-se de tantos recursos disponíveis que poderiam ter auxiliado em toda a operação, mas o que se viu foi a precariedade dos equipamentos utilizados, a falta de planejamento e mesmo o elementar isolamento da área, onde se podiam ver repórteres, vizinhos e curiosos interferindo a todo momento na movimentação. Faltou mesmo o estabelecimento de uma linha segura de contato com o seqüestrador, que dispunha de um celular por onde emissoras de televisão conseguiram conversar com o Lindemberg em rede nacional, influenciando no estado de ânimo do jovem que se mostrava alternadamente disposto a se render e levar o caso às últimas conseqüências. Ao ver-se entrevistado em rede nacional, podem ter-se atribuído status de falsa celebridade que lhe deu confiança para prolongar a agonia de suas vítimas.
De todos os erros, o mais sério é o desnudamento da precariedade da polícia paulista. Não seria necessária uma história terrível para se testar a falta de estrutura para atuar no combate a situações de risco. Ao exigir da polícia uma ação efetiva, segura e altamente profissional, a sociedade deve considerar o estado de penúria em que se encontra o aparato de segurança do País, onde faltam treinamento adequado, especialização, armamentos, equipamentos, prédios e instrumentos de operação. Sem isso, corre-se o risco de registrar novas tragédias a cada nova solicitação.
(Editorial Correio Popular, 22/10)
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