A história política de uma nação se escreve através de seus momentos mais importantes, que se encadeiam em causa e consequência inevitáveis, permitindo que sua análise forneça uma compreensão dos processos históricos determinantes e traga à tona motivações que levaram às alianças e improváveis aproximações que se percebem nos dias atuais.
Há exatos 20 anos, o Brasil colocava o ponto final em um de seus mais controversos períodos, assinalando o fim da ditadura militar e o nascimento de uma democracia que demandaria alguns anos para atingir o nível de consciência de uma geração inteira, desacostumada com o espírito crítico, com a participação ativista, com o direito elementar de se fazer ouvir e ter liberdade de desejar um futuro melhor de acordo com seus próprios padrões.
Ao fim de duas décadas com direitos tolhidos sob o jugo de um período de exceção, os brasileiros rearranjaram a casa e tomaram em suas mãos o destino da nação. Era o grito das Diretas Já!, um movimento de proporções inimaginadas, que levaria ao fim da ditadura pelos caminhos da não violência, da negociação política sem derramamento de sangue, pela retomada do poder pela sociedade livre e dona de seu destino.
As eleições de 15 de novembro de 1989 foram as primeiras diretas depois do golpe de 1964, consequência de um período de abertura que culminou com a eleição de Tancredo Neves e a posse de José Sarney, em circunstâncias que, hoje, explicam muito dos percalços percorridos pelo País nas décadas seguintes. O pleito veio cheio de simbolismos, trazendo uma nova geração, um sonho de mudança, uma oportunidade para reescrever a história com as letras fortes que imprimiram a Constituição Cidadã no ano anterior.
O número de 22 candidatos e a polarização final entre o discurso de esquerda de Luiz Inácio Lula da Silva e o de direita de Fernando Collor de Mello deveriam ser esperados. No rearranjo institucional, todas as tendências desejavam ser representadas e as linhas-mestras da nova política começaram a ser traçadas. Os passos seguintes são conhecidos: Collor inaugurou a sua República de Alagoas no Planalto e os mesmos jovens que pela primeira vez haviam votado viram o primeiro presidente da abertura sair pela porta dos fundos ao admitir a total incapacidade de gerenciar a crise política que se instalou a partir do Congresso.
O espelho da história é o reconhecimento dos fatos atuais. É possível entender o que acontece hoje, embora certas circunstâncias sejam realmente difíceis de explicar. Interessante observar que muitos dos personagens da época - relembrados em reportagem especial nesta edição - são hoje figuras proeminentes na política, aliados improváveis, apoiadores de ocasião, com discursos desconstruídos ao longo do tempo e das conveniências. Ao que a população assiste em indolente letargia, ansiosa por uma mobilização cívica que não se vê há exatos 20 anos.
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